segunda-feira, 4 de março de 2013

A Pedra do Sal ontem e hoje

Quando escrevi sobre o Rio de antes do samba, uma jovem amiga carioca, mandou-me uma mensagem referindo-se a uma roda de samba que acontece na Pedra do Sal, perto da Praça Mauá, no centro da Cidade Maravilhosa. Confesso que desta roda nunca participei, mas lembro do Morro da Conceição e da subida da Pedra do Sal, desde os tempos em que minha mãe me levava no Hospital dos Servidores, ali no bairro da Saúde. O lugar é cheio de história e vale a pena a gente registrar aqui.

Já li em vários livros que o bairro da Saúde e adjacências eram o local do Rio onde, nos séculos XVII e XVIII desembarcavam os escravos vindos da África para serem comercializados. Alguns não suportavam as condições precárias da longa viagem e já chegavam mortos ao destino. E muitos outros chegavam doentes, fracos e sem condições de serem vendidos naquele estado de saúde. Neste caso eram levados para as chamadas "casas de engorda" para serem alimentados e recuperados. O mar avançava até a região onde hoje está a Pedra do Sal, início da subida do Morro da Conceição.  Nesta região localizava-se toda a estrutura que preparava os negros para a venda no Cais do Valongo.


A tal pedra já chamou-se "quebra-bunda", mas depois ganhou o nome de Pedra do Sal, devido ao grande volume de sacas de sal levadas pelos negros morro acima. Dizem que a escadaria que até hoje se vê no local foi esculpida pelos próprios escravos, sem a utilização de ferramentas adequadas, para facilitar a subida.

Já na virada do século XIX para o XX, depois portanto da Abolição da Escravatura, começaram a chegar na região, negros vindos da Bahia, dando origem a uma comunidade que praticava, sem grandes problemas, seus hábitos religiosos, suas rodas de capoeira e batucadas. É muito comum a gente encontrar referências a "Pequena África", região compreendida entre a Praça Mauá e o Catumbi, no Rio, passando pela Praça XI,  onde residiam muitos negros vindos principalmente da Bahia.

Esta vocação da região da Pedra do Sal continuou por ocasião do êxodo de trabalhadores, ex-escravos, das fazendas de café do estado do Rio e do Interior de São Paulo, por conta da decadência do comércio de café. Os negros então buscaram abrigo na capital federal, em especial, onde sabiam que já residiam outros semelhantes baianos.

Muitos consideram esta região portuária do Rio de Janeiro, como a de origem do samba e do choro, porquanto moraram ou frequentavam a região, ícones como  João da Baiana, Donga, Sinhô, Pixinguinha, Heitor dos Prazeres, entre outros. Também da região era Hilário Jovino, criador de um dos primeiros Ranchos Carnavalesco do Rio, o Dois de Ouro. De lá também saíram as famosas baianas Bibiana, Marcelina e Ciata que promoviam em suas casas, batuques que mais tarde deram origem ao samba carioca que conhecemos. 

Não tendo dúvida da importância da área para a comunidade negra do Rio e para a cultura brasileira, o Governo do Estado Rio de Janeiro decretou o tombamento da Pedra do Sal, como patrimônio  cultural, em 20 de janeiro de 1984, devolvendo para o lugar um merecido movimento de sambistas que realizam as tais rodas de sambas, lembradas por minha amiga Ligia Tralhão.


Eu pesquisei muitos videos, livros e sítios na internet para produzir este texto. Mas recomendo, para quem quiser saber mais sobre  a Pedra do Sal a leitura de "Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro" do Roberto Moura. É um referência sobre as origens do samba urbano carioca. Vai lá e lê.

Fique à vontade para tecer algum comentário. Um abraço, grato pela visita e até a próxima.

15 comentários:

  1. Transcrevo mensagem da amiga Ana Teresa:

    "Querido Cláudio: Como sempre,vc capricha nas informações!
    Conheci a Pedra do Sal,em 2011,na comemoração do aniversario da minha sobrinha(foi ela quem me apresentou o local) e adorei o samba,cantado e tocado sem microfone,nem amplificadores.Foi uma delicia de 2a feira,a noite!!!!!!!!!
    Bjs,

    Ana Tereza

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  2. Pra variar, a competência sempre acompanha tudo o que você faz. Me lembro do estúdio, do Companhia do Som, Meu Barraco, Tons e Sons, e claro, do parceiro Elias Marujo. Parabéns pelo blog (só tive tempo de "passeá-lo" agora. Grande abraço.

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    1. Bira, a sua visita é ilustre e suas palavras um espécie de selo de qualidade, ISO9000. Minha sina por aqui é fazer com que os jovens não deixem a petec cair e busquem ler e ler mais sobre o samba e choro.
      Um grande abraço e muitíssimo obrigado irmão!

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  3. Amigo Caldas,

    Parabéns pelo blog. Extraordinário! Estarei sempre acommpanhando, a partir de hoje, as histórias do nosso samba e do Rio de Janeiro, minha segunda cidade! Forte abraço!

    Vandrei Bion

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    1. Caramba, mais uma nobre visita.
      Vandrei, fico super contente com o seu acompanhamento e agradeço as palavras.Este é combustível para eu continuar escrevendo. Temos nós muitas coisas em comum no coração, né? Se vc. quiser divulgar a existência do blogue pra sua comunidade, fique á vontade e um grande abraço irmão!

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  4. Pedra do Sal. Parte do velho Rio. Realmente a escadaria é uma obra de arte. Antigamente, muitas pessoas tinham receio de subir esta rua, pois tinha fama de ter muita malandragem. Gostei muito do seu texto uma verdadeira aula de História. Abraço do Joel

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    1. Joel, meu cartunista predileto, agradeço o comentário e visita. Pra quem não sabe, ele é quem desenha o Pitoco que está ali como recomendação de blogues que eu curto.
      Pensar que aquelas escadas foram feitas pelas mãos dos escravos, sabe-se lá com que ferramentas, já é demais...
      um Grande abraço e volte sempre!

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  5. Ainda bem que você agora tem tempo para pesquisar essas belas histórias e nos repassar informações tão interessantes! Viva a aposentadoria!
    Bjs,
    Susana

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    1. Senti, em suas letrinhas, uma certa invejinha irmã querida...calma que o seu tempo chegará.
      Grato pela prestigiosa visita e volta sempre.
      Bjs

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  6. Olá! Quais livros o senhor utilizou para a pesquisa? Fiquei bastante interessada
    bjs

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    1. Amiga L, como descrevi, o livro mais legal sobre esta época da formação do samba na Pedra do Sal é mesmo o "Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro" do Roberto Moura. Mas hoje, com o acesso a teses de Mestrado na internet, já li vários trabalhos sobre o assunto.
      Grato pela visita e volte sempre!

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  7. Gostei da leitura, e era exatamente o que eu precisava.

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  8. Obrigado irmão. E muito grato pela visita. Volte sempre!

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Fique à vontade para expressar-se. E muito grato pela visita. Volte sempre!