As
histórias de hoje são de Jacob do Bandolim. Um extraordinário instrumentista.
Um compositor inspiradíssimo. Um cuidadoso historiador da música. Enfim, como
Pelé que nasceu depois e ficou mais conhecido que ele, eu digo que Jacob do
Bandolim é um Pelé do Choro. Mas o certo mesmo era dizer que o Pelé é um Jacob
do Bandolim do futebol.
E já
que falamos de futebol, comecemos por registrar duas de suas composições
ligadas ao tema, tendo, desde já, claro que Jacob era torcedor do Vasco da
Gama, do Rio de Janeiro, onde nasceu, a 14 de fevereiro de 1918. Mas não pensem
que tinha origens portuguesas. Sua mãe era uma judia polonesa refugiada da
Primeira Guerra Mundial. Mas note o leitor como a guitarra portuguesa aparece
logo na introdução do choro "Vascaíno", gravado em 1951.
Mas a sua paixão pelo Vasco não impediu de compor um belíssimo choro cujo título é "Ginga do Mané", homenagem deliciosa ao gênio Mané Garrincha, logo após a conquista da Copa do Mundo de 1962.
Como
Pelé, Jacob teve também o seu parceiro de muitas glórias. E se o Pelé teve
Coutinho pra realizar as tabelinhas inesquecíveis na área adversária, Jacob encontrou
o camarada ideal para acompanhar o seu bandolim em 1939, na Rádio Ipanema. Era
Benedito César Ramos de Faria, um violonista que servia ao exército no Forte de
Copacabana e frequentador da Rádio Ipanema que ficava próxima, ali no Posto 6,
em cima do Cassino Atlântico. Um belo dia o Jacob precisou de um violonista e
chamou César Farias para um teste no terraço do prédio. Foi o bastante pra
nunca mais se separem e mais tarde constituírem o Conjunto Época de Ouro, que
até hoje nos brinda tocando choros, mesmo tendo já alterado sua formação tantas
vezes. E César Farias, pra quem não está ligando o nome à pessoa, foi o pai de
Paulinho da Viola.
O
Conjunto Época de Ouro merece uma postagem à parte. Formado inicialmente por
César Farias, Carlinhos Leite (violões de 6 cordas), Dino (7 cordas), Jonas
(cavaquinho) e Gilberto (pandeiro), além do seu criador e idealizador, o
próprio Jacob do Bandolim, o Época de Ouro marcou nas gravações de choros dos
anos 60. Escutemos "Vibrações, choro de autoria do Jacob do Bandolim, que
inclusive deu nome ao primeiro LP do conjunto.
O grande maestro Radamés Gnatalli compôs "Retratos", uma suíte para bandolim, orquestra e regional, em quatro movimentos. Cada um deles homenageando um ícone da nossa música instrumental. No primeiro Pixinguinha, no segundo Nazareth, no terceiro Anacleto de Medeiros e por fim, Chiquinha Gonzaga. Pois Jacob, que sempre buscava a perfeição, estudou a peça a exaustão, ensaiou e apresentou-se no Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro, em agosto de 1964, acompanhado da orquestra da gravadora CBS.
Todos
sabemos que o Pelé com a bola nos pés sempre foi genial...mas nem sempre foi
feliz ao fazer seus comentários sobre os mais diversos assuntos. Pois até nisso
eu considero os dois parecidos. Certa vez Jacob disse que
"Delicado", um popular baião de Waldir Azevedo "era um marco
deteriorador da música brasileira". De outra vez disse que "a música
de Waldir Azevedo era um amontoado de toleimas , de sandices". Sobre a
bossa-nova, que havia entrado na moda no final do anos 50, considerava
"uma tentativa de imitação do jazz, que eliminava as mais autênticas
inflexões da música brasileira". Caramba, o homem não gostava de algumas
das mais belas manifestações de nossa música e deixava claro.
Mas
fiquemos com a maravilhosa carioquice do nosso personagem, que não bebia e nem
era da "night", mas era considerado um dos maiores representantes do
choro, manifestação típica do seu Rio de Janeiro. O que dizer de "Noites
Cariocas"...uma das mais perfeitas traduções da cidade?
Jacob do Bandolim sofreu com seu coração. O primeiro infarte teve em 1967, logo após forte comoção, ao ser aplaudido de forma efusiva por uma platéia composta por jovens no Teatro Casa Grande. Acabara de tocar "Lamentos" de Pixinguinha e confessou o espanto emocionado em outra oportunidade: "Para mim foi uma grande felicidade ter sido aplaudido pelos cabeludos, que compreenderam a minha arte". Acabou por falecer do coração, no terceiro infarte ocorrido logo após uma visita feita a casa de Pixinguinha, em 13 de agosto de 1969.
Para saber mais e ouvir muito mais sobre Jacob do Bandolim, as melhores fontes são o livro "Jacob do Bandolim", de Ermelinda de Azevedo Paes, o sítio jacobdobandolin.com.br e "Choro, do Quintal ao Municipal", excelente livro de Henrique Cazes. Quando puder beba nestas fontes. Um abraço e até a próxima.
O Jacob era mesmo chegado a ditar regras e não admitir concorrência. O filho dele, Sérgio Bittencourt, também era, com a diferença que não tinha talento. Então, o melhor a se fazer é apenas ouvir as músicas do Jacob, que ele interpretava com grande perícia, e deixar de lado sua parcela egoísta e encrenqueira. Fidelidade a um tipo de música, no caso o choro, não precisa vir acompanhada de patrulhamento. Por isso é bom ver nesta postagem os videozinhos do Youtube, com a beleza das músicas enriquecida pela mestria dos intérpretes.
ResponderExcluirNão é correto dizer que Sérgio Bittencourt "não tinha talento". Ele não foi um músico do porte de seu pai, mas foi um jornalista atuante, tendo trabalhado em importantes órgãos de imprensa do Rio de Janeiro e de São Paulo (rádio, jornal e televisão). Como compositor, ele teve mais de trinta músicas gravadas por intérpretes como Eliana Pitman, Nelson Gonçalves, Carlos José, Waleska, Elizeth Cardoso, Pery Ribeiro, Elis Regina, Taiguara, Ângela Maria, Maria Creusa e Wilson Simonal, entre outros. É autor de dois clássicos da nossa música: Modinha e Naquela Mesa.
ExcluirDigamos que essa concorrência entre Jacob e Waldir foi muito saudável, afinal, um queria compor um choro mais bonito que o outro. E deu no que deu. Um vasto repertório de belíssimos choros que, no 'frigir dos ovos', quem saiu mesmo ganhando fomos nós.
ResponderExcluirA informação que tenho é que a musica Vascaíno era para seu filho, este sim era torcedor. Jocob não era Vasco. Terá fundamento o que afirmei?
ResponderExcluirGrato pelo registo amigo. Eu não tenho esta informação. Que Sérgio Bittencourt era vascaíno sim, era público e notório. Abração
ExcluirCorreto. Jacob não se interessava por futebol; o vascaíno era seu filho Sérgio.
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